Volume 21 - Número 1
Editorial
Como diferenciar e abordar refluxo gastroesofágico fisiológico (regurgitação do lactente) e doença do refluxo gastroesofágico: uma síntese de evidências
INTRODUÇÃO: O refluxo gastroesofágico fisiológico (RGF) é um fenômeno de escape do conteúdo estomacal para o esôfago por imaturidade do esfíncter esofagiano inferior, que tende a desaparecer por volta de um ano de idade. Essa manifestação geralmente não vem acompanhada de outros sintomas. Já a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é caracterizada pela regurgitação crônica, que pode permanecer além de um ano de vida, associada a outras manifestações como choro, irritabilidade e perda ponderal.
OBJETIVO: Capacitar o profissional da saúde a reconhecer e diferenciar as duas patologias, conhecer os meios diagnósticos e saber escolher de maneira eficaz a terapêutica selecionada para cada caso.
MÉTODO: Revisão da literatura com pesquisa efetuada a partir das bases de dados PubMed, ScIELO e Google Acadêmico, selecionando os artigos que cumpriram os critérios de inclusão escolhidos.
SÍNTESE DE EVIDÊNCIAS: O estudo demonstrou que, a partir de uma boa anamnese, é possível coletar informações importantes para diferenciar as duas afecções, uma vez que o que as diferencia é a presença de sintomas como perda ponderal, irritabilidade e choro na DRGE e persistência do refluxo por um tempo maior, o que não ocorre no RGF. Em relação ao manejo, é importante adotar, em ambas as situações, medidas alimentares e posturais a fim de aliviar os sintomas. Em caso de necessidade de medidas medicamentosas, avaliar o uso de fármacos como os inibidores de bomba de prótons (Esomeprazol) e pró-cinéticos (Domperidona).
Perfil epidemiológico, clínico e laboratorial de crianças hospitalizadas por doenças respiratórias e análise da evolução após hospitalização
INTRODUÇÃO: Doenças respiratórias são a principal causa de hospitalização e morbimortalidade em crianças sendo que numerosos fatores afetam sua prevalência e gravidade.
OBJETIVO: Verificar o perfil epidemiológico e viral de crianças internadas com doença respiratória e necessidade de oxigenoterapia em uma Unidade de Emergência em Referência Pediátrica.
MÉTODOS: Crianças com idade inferior a 5 anos admitidas no hospital com doença respiratória e necessidade de oxigenoterapia foram incluídos. Foi aplicado ao cuidador um questionário epidemiológico e clínico e, posteriormente, foi realizada a coleta de amostras nasofaríngeas para identificação viral. As análises estatísticas foram realizadas pelos testes Exato de Fisher ou Mann-Whitney usando um nível de significância de 0,05.
RESULTADOS: Vinte e três pacientes foram incluídos sendo que 56,5% eram do sexo masculino, 65,2% tinham um ou mais irmãos =10 anos, 78,7% relataram história de atopia, 39,1% tiveram identificação viral positiva e 60,9% foram hospitalizados. A aglomeração de famílias foi associada ao isolamento viral positivo e menor número de visitas à Unidade de Emergência. Readmissões hospitalares foram associadas ao nascimento prematuro, isolamento viral positivo e história de chiado no peito. O uso de medicação contínua foi frequente entre aqueles que foram hospitalizados, com mais de 1 irmão =10 anos e história de chiado no peito.
CONCLUSÕES: Ser do sexo masculino, ter mais de 1 irmão =10 anos e morar em residência com maior número de indivíduos pode ser fator de risco para doenças respiratórias.
Meningite meningocócica complicada com abscesso cerebral em lactente jovem - Relato de caso
INTRODUÇÃO: A doença meningocócica apresenta elevada morbidade e letalidade. Sua principal manifestação é a meningite, com febre, mialgia, náuseas e vômitos, irritabilidade, rigidez de nuca e rash hemorrágico, podendo evoluir com complicações neurológicas. Descreve-se um caso clínico com apresentação incomum em lactente jovem com meningite meningocócica complicada.
RELATO DE CASO: Lactente de um mês, previamente hígido, com febre há três dias e dor abdominal, internado na unidade de terapia intensiva em choque séptico, sedado, intubado, recebendo aminas e antibioticoterapia empírica, apresentando ptose palpebral à direita e fontanela abaulada. Identificou-se meningococo no líquor por técnica molecular. A despeito de terapêutica adequada com ceftriaxona, mantinha crises convulsivas complexas, labilidade térmica e alterações liquóricas de celularidade, bioquímica e PCR positivo para meningococo em análises seriadas. Tomografia computadorizada de crânio evidenciou abscesso temporal direito, drenado pela neurocirurgia, com posterior melhora clínica e do líquor. Recebeu antibioticoterapia com ceftriaxona por 31 dias, e meropenem e vancomicina por 14 dias, para tratamento de pneumonia no pós-operatório. Em avaliação de sequelas neurológicas, identificou-se palidez de nervo óptico bilateral em fundo de olho.
DISCUSSÃO: O manejo adequado de crianças com doença meningocócica é de suma importância para o desfecho clínico. É imperativo que o pediatra suspeite de doença meningocócica em quadro clínico febril agudo, especialmente em lactentes jovens, permitindo a instituição de terapêutica adequada precocemente e diminuindo sua morbimortalidade. Complicações neurológicas devem ser suspeitadas na persistência da febre após tratamento ou na presença de sinais neurológicos focais ou alteração do nível de consciência.
Repelentes tópicos em pediatria: aspectos toxicológicos e de segurança
O aumento no interesse por medidas preventivas frente às arboviroses, motivado pelas possíveis graves consequências de muitas delas, desde a concepção até a adolescência, tornou obrigatórios aos pediatras conhecimentos mínimos sobre uso e toxicidade dos repelentes cutâneos. Através de busca na plataforma MEDLINE-Bireme, dos artigos mais relevantes nos últimos 22 anos (1998-2020) em relação ao uso clínico, efeitos colaterais e toxicológicos dos repelentes cutâneos, foram selecionados 65 artigos, dos quais 11 serviram de base para este artigo. O presente estudo tem como objetivo analisar, de modo prático, os principais compostos presentes em diversos repelentes de insetos no mercado brasileiro, seus aspectos toxicológicos e orientações quanto ao uso adequado na população pediátrica. Conclui-se pela importância do uso correto dos mesmos, evitando exposição excessiva e ingestão acidental. O uso de métodos combinados, em muitos casos, pode oferecer maior proteção com menor risco toxicológico.
Palavras-chave: Repelentes de Insetos, Pediatria, Uso de Medicamentos.Síndrome de Hurler: Desafio no Manejo Clínico e Importância do Diagnóstico Precoce
A mucopolissacaridose tipo I (MPS I) é uma doença rara que se caracteriza por deficiência da a- l-iduronidase, enzima lisossomal responsável pelo metabolismo dos glicosaminoglicanos (GAGs) de sulfato de dermatan e sulfato de heparan, causando um acumulo patológico dos mesmos no organismo. A doença é hereditária, autossômica recessiva e seus fenótipos podem variar. Seus sinais e sintomas iniciais podem ser específicos como opacidade ocular e deformidade da coluna vertebral ou podem ser confundidos com os de várias outras patologias como infecções auditivas recorrentes e até mesmo perda auditiva, hérnias, sintomas cardíacos e infecções respiratórias frequentes, dificultando o diagnóstico e, consequentemente, o tratamento, o qual, se iniciado de maneira precoce, poderia evitar o surgimento de sequelas irreversíveis, além de reduzir significativamente a progressão da doença. Relatamos caso de paciente, seis anos de idade, sexo feminino, diagnosticada com MPS I com 20 meses. Segundo sua história clínica, a mesma já apresentava atraso neuropsicomotor, hipertrofia de ventrículo esquerdo, infecções de vias aéreas de repetição, adenoidectomia e duas herniorrafias umbilical e inguinal, porém sem estabelecimento de diagnóstico de base. O diagnóstico correto, ainda que tardio, possibilitou início de terapia de reposição enzimática (TRE), melhor acompanhamento de possíveis complicações clínicas, além do aconselhamento genético da família.
Palavras-chave: Mucopolissacaridose I, Glicosaminoglicanos, Diagnóstico Precoce, Terapia de Reposição de Enzimas.Urticária crônica na infância: como tratar?
INTRODUÇÃO: A urticária crônica pode acometer todas as idades com prevalência baixa na infância. O tratamento correto é importante para evitar efeitos adversos desnecessários.
OBJETIVO: Relatar caso de criança com urticária crônica espontânea (UCE) com efeitos adversos por tratamento inadequado.
DESCRIÇÃO DO CASO: Menino, 8 anos, apresentou UCE com duração superior a 6 semanas. Procurou atendimento médico em emergência várias vezes, sendo prescritos anti-histamínicos (anti H1) de primeira geração associado a corticosteróide oral que foram mantidos por 4 meses, evoluindo com efeitos colaterais pela corticoterapia. Foi avaliado por alergista e os exames complementares demonstraram supressão adrenal. Iniciou tratamento com anti-H1 de segunda geração em dose quatro vezes acima da dose licenciada, reduzindo gradualmente o corticoesteróide e após 2 anos, de acompanhamento apresenta controle dos sintomas em uso de desloratadina em dose padronizada.
COMENTÁRIOS: O uso de anti-H1 de segunda geração é a primeira escolha no tratamento da urticária crônica. No caso de insucesso, a dose pode até ser quadruplicada. Se não ocorrer controle, a terceira etapa é a adição de omalizumabe para crianças acima de 12 anos. A quarta etapa é a inclusão de ciclosporina. O uso de corticosteróides está restrito a cursos curtos nas exacerbações.
Histiocitose de células de langerhans: Relato de caso com ênfase no diagnóstico diferencial
INTRODUÇÃO: Histiocitose de células de Langerhans é uma neoplasia inflamatória causada pela multiplicação de células aberrantes do sistema mononuclear fagocítico. Trata-se da desordem histiocitária mais comum, afetando cerca de 5 crianças por milhão, na faixa etária de 0 a 15 anos, similar à frequência do linfoma Hodgkin.
OBJETIVO: Relatar um caso de histiocitose de células de Langerhans de alto risco, destacando a importância do diagnóstico diferencial em casos de linfadenopatia e as dificuldades geográficas do Amazonas para seguimento adequado do paciente.
DESCRIÇÃO DO CASO:Adolescente de 13 anos, do interior do estado do Amazonas, apresentou linfadenopatia em região cervical, axilar e supra-clavicular. Foi realizado tratamento para tuberculose ganglionar, mas as lesões pioraram com o passar do tempo, indicando a necessidade de realização de biópsia. Foi, então, constatada histiocitose de células de Langerhans, confirmada pela imuno-histoquímica. No momento, o paciente se encontra em tratamento para a condição, com boa resposta terapêutica a despeito das dificuldades geográficas e socioeconômicas.
DISCUSSÃO: O espectro clínico vasto da histiocitose dificulta seu diagnóstico precoce. O paciente apresentou acometimento linfonodal, raro para essa doença e fato que suscitou o diagnóstico diferencial com tuberculose ganglionar, a primeira hipótese sugerida para a criança. Portanto, é de suma importância considerar a histiocitose no grupo de doenças que cursam com linfadenopatia cervical. Além disso, o caso suscita a discussão em torno de questões geográficas e como as mesmas podem interferir para diagnóstico e tratamento adequados.